Como não pediram muito para não explicar, e aproveitando o facto de ontem ter sido noite de mais umas viagens nepalesas, aqui fica o elucidamento possível acerca dos aviões que voam informaticamente. Como referi no outro dia, a minha intervenção abarca correntemente 3 áreas distintas. A saber: aviação de aeroclube (presentemente voando no SplashClub), aviação de aerolinha por conta própria (tipo "eu sou dono desta companhia e voo o avião que me apetece, de onde me apetece e para onde me apetece", portanto, num exercício extremo de democracia) e finalmente a aviação de aerolinha "profissional" (no caso voando para a SATA Virtual, pertencendo aos quadros da companhia SATA Air Açores Virtual). Tinha ainda a quarta linha de actuação que era o meu site, mas por escassez de tempo tive de deixar de o actualizar. A temática é vasta, e não querendo abusar da paciência dos caríssimos compartilhantes deste espaço familiar, verso hoje sobre a base teórica do voo simulado para, em próximas ocasiões, (caso continuem a não pedir muito), escaranfunchar as diferentes vertentes atrás tecladas. A ferramenta principal é o simulador de voo. O mais desenvolvido e usado pela generalidade da comunidade de aviação virtual é o Microsoft Flight Simulator - vulgo "FS". Já vai na nona versão (se quiserem saber a história deste simulador, gastando 32Mb, podem ver este filme) e é aprovado pela Força Aérea Americana para treino "primário" de pilotos. Disponibiliza uma série de diferentes aviões bem como aquilo a que chamamos o cenário. O cenário é o mundo em si, com as cidades, montanhas, rios, oceanos e, claro, para aí uns 4 mil e tal aeroportos. É o que se vê nas fotos que acompanham este texto e o do meu post anterior sobre o assunto. Além disso estão também incluídas todo o tipo de rádio-ajudas de navegação existentes no mundo, colocadas nos seus devidos lugares, isto é, correspondendo à sua posição real no terreno. Claro que muita coisa não é perfeita. Se em Lisboa podemos ver a Ponte sobre o Tejo, já o Aqueduto das Águas Livres não está presente. No entanto, há muita gente que desenvolve "programas" (chamados "add-ons" porque se "adicionam" ao simulador) para complementar e melhorar as coisas menos exactas do simulador base. Assim, e por exemplo, se no FS "base" podemos encontrar as pistas de Lisboa com a orientação e tamanho correcto já os edifícios do aeroporto não são iguais aos reais. Ora, com a instalação de um add-on ficamos com o aeroporto tal e qual ele é. Estes add-ons por vezes são pagos, outras são gratuitos.
Concordo que nesta fase não há muita diferença entre isto e um banal jogo de corrida de automóveis. Nos mais recentes, até lá estão as pistas certinhas, as bancadas, enfim, tudo muito realista também. Mas a diferença começa aqui. Com o advento da internet, a par do aperfeiçoamento do simulador, começou a ser possível abandonar a posição do "voar sózinho em casa" para partilhar o espaço virtual com outros "aviadores de sofá" e, muito importante, com os controladores de tráfego aéreo. Sim, porque a par dos malucos que gostam de voar há a categoria dos malucos que gostam de ser sinaleiros dos céus. Para além disso, a existência no simulador de todo o tipo de rádio-ajudas de navegação (também chamados rádio-faróis pela similitude com os faróis terrestres de ajuda à navegação marítima) permite ao aviador e controlador virtuais simular, de facto, todos os procedimentos que são feitos na realidade. Para além disso, há quem se dedique (mais uma vez, comercialmente ou não) a desenvolver simuladores mais detalhados de diversos tipos de avião - Airbus, Boeing, etc. O nível de realismo pode ser bastante grande obrigando à leitura de dezenas de páginas de manuais a fim de poder operar o avião. Adicionalmente e para estar apto a voar nas redes de simulação, isto é, partilhando o mesmo espaço cibernético com outros pilotos e controladores, há que estudar um bocado para adquirir conhecimento em áreas como navegação aérea, procedimentos de voo, interpretação de cartas aeronáuticas (são usadas as cartas reais, iguais às que os pilotos levam nos seus aviões), interpretação de relatórios de meteorologia, fraseologia própria para comunicação, e mais uma catrapazada de outras coisas. Para não tornar isto tudo muito longo e maçudo, imaginem o seguinte. Eu estou sentado aqui em casa, e posiciono no computador, ou no "jogo" se preferirem, o "meu" Airbus na placa do Aeroporto de Lisboa. Como estou ligado à internet (e através de uma série de tecnicalidades que não vale a pena detalhar), estou a partilhar o espaço cibernético com outros pilotos e com os controladores de tráfego. Por exemplo, pode acontecer estar a olhar pela janela do meu avião e ver um Boeing, por exemplo da Varig, que está a ser "manejado" por alguém sentado na sua casa em, digamos, São Paulo. A "ver-nos" a ambos, no seu ecrán de radar virtual, está o controlador que nos dará a todas as instruções necessárias para podermos fazer o voo (autorização de rota, indicações de caminho para a pista e orientação do voo quando no ar). Estas instruções são-nos transmitidas por voz (através de programas simpáticos que nos permitem falar, de facto, através da internet), tal como num rádio real de comunicação (temos que sintonizar a respectiva frequência no rádio do avião). Mais, se eu olhar pela janela de casa e lá fora estiver o céu carregado, a chover, e uma grande ventania, o mais certo é que se "olhar" pela janela do meu avião, também vou ver o céu carregado, provavelmente estará a chover e terei também uma grande ventania, tendo o vento até a mesma direcção que na realidade. Isto porque o simulador descarrega da internet os relatórios de meteorologia, reais e em tempo real, dos aeroportos e simula as respectivas condições de tempo.
Por estas coisas é que este passatempo é razoavelmente distinto do vulgar jogo de computador. Há uma forte interacção com a realidade e há o factor-humano. De facto, simula-se, não se joga. E sim, muito mais há a dizer sobre o assunto, mas se chegaram até aqui tenho que dar os parabéns e não arrisco mais a vossa generosa paciência. Espero ter conseguido dar uma ideia de como as coisas se passam, isto em termos de simulador e meios existentes. O que faço, na prática, terá que ficar para outra ocasião. Se pedirem muito, claro...
PS: as fotos que acompanham o texto dizem respeito ao "passeio" de ontem. Mais uma jornada com nevoeiro à saída e à chegada mas com o disfrutar de paisagens incríveis enquanto se voava no meio dos vales rodeados de escarpas em busca de uma mísera tira de relva onde pousar o pássaro.
18 novembro 2005
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3 comentários:
Quando vi o tamanho do post pensei duas vezes se o ia ler todo, mas depois de começar tive de continuar até ao fim, porque fiquei a morrer de curiosidade...
Fiquei interessada, mas tempo pra voar virtualmente, nem daqui até Cascais. Talvez se partir uma perna.. :)
Deve ser muito giro. (o simulador, não a perna partida)
Garanto, sob palavra de honra, que li tudo com interesse e atenção. Acrescento ainda mais que o Miguel descreve com muita qualidade, prendendo a atenção do leitor e vendendo muito bem o seu peixe, que por sinal é um pássaro.
Confesso que só hoje acabei de ler o post. As descrições são interessantíssimas e dá para perceber a paixão que o nosso piloto virtual tem pela aviação.
Será que se perdeu um piloto "real" de alto gabarito? Parece, não é?
Pode continuar.
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